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As cores no cinema

O uso das cores no cinema transcende a mera estética visual, adentrando as profundezas da experiência humana e da percepção da realidade. Ao empregar uma paleta cromática cuidadosamente selecionada, os cineastas não apenas adornam a tela com tons vibrantes ou sombrios, mas também exploram os recônditos da psique humana, manipulando as emoções, os pensamentos e as sensações dos espectadores.

De uma perspectiva filosófica, as cores no cinema são mais do que simples pigmentos; são veículos de significado, portadores de simbolismo e mensageiras de verdades ocultas. Elas ecoam as profundezas do inconsciente coletivo, ressoando com arquétipos ancestrais e mitos primordiais. Assim, cada tonalidade, matiz e sombra torna-se um símbolo, carregando consigo camadas de significado que transcendem o mundano e o banal.

A paleta cromática de um filme pode ser interpretada como uma linguagem simbólica, com cada cor contando uma história própria. O uso das cores desempenha um papel fundamental na narrativa visual, na expressão emocional e na criação de atmosfera. Desde os primeiros filmes em preto e branco até as produções coloridas mais recentes, as escolhas cromáticas têm sido guiadas por princípios filosóficos e psicológicos que refletem as visões estéticas, culturais e emocionais dos cineastas.

O Cair das Folhas de Alice Guy-Blaché. EUA – 1912

O Martírio de Joana D’Arc de Carl Theodor Dreyer. FRANÇA – 1928.

As cores são utilizadas de diversas maneiras para transmitir significados e emoções. Por exemplo, o contraste entre cores quentes, como vermelho e laranja, e cores frias, como azul e verde, pode evocar diferentes sensações no espectador. O vermelho muitas vezes é associado à paixão, ao perigo ou à raiva, enquanto o azul pode sugerir calma, tranquilidade ou melancolia.

Mais detalhadamente o uso dessas cores e seu contraste no cinema:

  • Cores Quentes:
    • O vermelho é uma cor intensa, associada à paixão, ao amor, à raiva e ao perigo. No cinema, o vermelho muitas vezes é utilizado para destacar elementos importantes na cena, como sangue, fogo ou objetos de grande importância emocional.
    • O laranja é uma cor vibrante, associada à energia, à criatividade e à vitalidade. No cinema, o laranja pode ser utilizado para transmitir sentimentos de entusiasmo, alegria ou excitação.
    • O amarelo é uma cor brilhante, associada à luz, à felicidade e à positividade. No cinema, o amarelo pode ser utilizado para criar uma atmosfera ensolarada e acolhedora, ou para representar a esperança e o otimismo.
  • Cores Frias:
    • O azul é uma cor tranquila e serena, associada à calma, à melancolia e à introspecção. No cinema, o azul pode ser utilizado para transmitir uma sensação de paz e tranquilidade, mas também pode ser usado para criar uma atmosfera sombria e misteriosa.
    • O verde é uma cor associada à natureza, à vida e à renovação. No cinema, o verde pode ser utilizado para evocar uma sensação de frescor e vitalidade, mas também pode ser usado para transmitir uma atmosfera de mistério ou perigo.
    • O roxo é uma cor misteriosa e intrigante, associada à magia, à espiritualidade e à realeza. No cinema, o roxo pode ser utilizado para criar uma atmosfera de fantasia ou para transmitir uma sensação de mistério e intriga.

Exemplo de uso da cor QUENTE e FRIA para especificar o momento dos personagens na história. Feito na América de Doug Liman, 2017 – EUA.

O contraste entre cores quentes e frias no cinema é muitas vezes utilizado para criar uma sensação de equilíbrio visual e emocional. Por exemplo, um filme pode utilizar cores quentes para transmitir emoções intensas, como paixão ou raiva, e cores frias para transmitir emoções mais tranquilas, como calma ou melancolia. Além disso, o contraste entre cores quentes e frias pode ser utilizado para destacar elementos importantes na cena, criar profundidade visual e guiar o olhar do espectador.

Cidade de Deus de Fernando Meirelles e Kátia Lund, BRASIL – 2002

Coringa de Todd Phillips, EUA – 2019.

O Fabuloso Destino de Amélie Poulain de Jean-Pierre Jeunet, FRANÇA – 2001.

Outro princípio filosófico relacionado ao uso das cores no cinema é a estética, que busca compreender a beleza e a harmonia visual. Os cineastas muitas vezes utilizam paletas de cores cuidadosamente selecionadas para criar composições visuais que são esteticamente agradáveis e impactantes.

A estética no cinema vai além das cores, vou explicar um pouco sobre os diversos elementos que compõem este vasto conceito nos filmes.

  • Aspectos Visuais:
    • A composição visual das cenas, que inclui o enquadramento, a iluminação, a paleta de cores, os cenários, os figurinos e os efeitos visuais.
    • A cinematografia, que abrange a escolha de lentes, movimentos de câmera, profundidade de campo e outros aspectos técnicos relacionados à captura da imagem.
    • A direção de arte, que envolve a criação de ambientes e objetos que contribuem para a atmosfera e o estilo visual do filme.
  • Aspectos Auditivos:
    • A trilha sonora e a música, que podem influenciar o clima emocional do filme e a percepção das cenas pelos espectadores.
    • O design de som, que engloba os efeitos sonoros, a mixagem e a manipulação dos elementos sonoros para criar uma experiência auditiva imersiva.
  • Aspectos Narrativos:
    • A estrutura narrativa do filme, que inclui o desenvolvimento de personagens, a progressão da trama, a construção de tensão e o desfecho da história.
    • O estilo de montagem, que determina como as cenas são organizadas e interligadas para criar um ritmo narrativo fluido e coeso.
    • O uso de simbolismo, metáforas e temas recorrentes que adicionam camadas de significado à narrativa do filme.
  • Aspectos Emocionais e Intelectuais:
    • A capacidade do filme de provocar uma resposta emocional no espectador, seja através da empatia com os personagens, da criação de suspense, da evocação de sentimentos específicos ou da reflexão sobre questões universais.
    • A profundidade temática e filosófica do filme, que pode explorar questões sociais, políticas, culturais, existenciais e metafísicas de maneira provocativa e perspicaz.

Exibição de Limite, de Mário Peixoto. BRASIL – 1931

Em resumo, a estética no cinema é uma combinação complexa de elementos visuais, auditivos, narrativos e emocionais que contribuem para a experiência artística e sensorial do espectador. É a expressão criativa da visão do cineasta e uma parte essencial da linguagem cinematográfica, que busca transmitir significado, emoção e beleza por meio da tela grande.

Além disso, o contexto cultural e histórico de um filme também influencia as escolhas cromáticas. Por exemplo, filmes ambientados em diferentes épocas ou culturas podem empregar paletas de cores específicas que refletem os estilos e as tendências daquele período ou lugar.

O uso das cores no cinema é uma prática complexa que envolve uma série de princípios filosóficos, estéticos e culturais. Desde os primórdios da sétima arte até os dias de hoje, as cores têm sido uma ferramenta poderosa para os cineastas expressarem suas visões artísticas, emocionais e narrativas, contribuindo para a riqueza e a diversidade do cinema ao longo da história.

Saiba mais sobre as cores no cinema neste vídeo do canal In Depth Cine. Ative a legenda em portguês para assistir.

O livro ”Cores & filmes: Um estudo da cor no cinema” de Maria Helena Braga e Vaz da Costa amplia o estudo das cores no cinema.

Leo Arturius

Graduado em Pedagogia e Cinema pela PUC-Rio, Leo Arturius assumiu a cadeira de direção em sete filmes, como produtor foram oito e outros sete como continuísta. Desde 2016 oferece cursos de roteiro e documentário na cidade de Nova Friburgo e, em 2017, obtive seu ápice profissional ao ter um filme selecionado no Festival de Cannes. A carreira teve uma guinada em 2019, começou a fazer exposição de fotografia sobre a cidade de Nova Friburgo. Friburguenses e cariocas já tiveram a oportunidade de entrar em contato com seu olhar de estrangeiro sobre a cidade serrana. Em 2023 assumiu a cadeira de professor no Colégio Nossa Senhora das Dores e Senai Nova Friburgo, no ano vigente retorna a atuação regular em produções e direção cinematográficas e ao cargo de produtor de conteúdo na TV Zoom.

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