O documentário, um outro cinema
Um equívoco comum é classificar um documentário como um gênero cinematográfico. Essa concepção remonta aos tempos das locadoras de vídeos, que optavam por organizar sua seleção por gêneros para facilitar a busca dos clientes. Diante dos documentários, surgiu a dúvida: como categorizá-los? Acabaram sendo designados como um gênero em si, um padrão que se popularizou e perdura no consenso popular até os dias atuais.
Entretanto, é crucial compreender que o documentário não se enquadra estritamente como um gênero, e sua definição não é simplista. Dentro deste formato cinematográfico, há uma multiplicidade de categorias.
Ao contrário da ficção, que elabora narrativas e personagens fictícios, o documentário tem por objetivo retratar eventos, pessoas e situações diversas. Todo o material parte da realidade, sendo moldado pelos cineastas de maneira a capturar a autenticidade da forma de olhar de quem realiza, e não o comprometimento com a “verdade”. A verdade no documentário é um karma. Documentário é aquele que educa, isso também é um karma.
Embora frequentemente associado ao jornalismo, o documentário se distingue por sua liberdade criativa. Por meio de diversas técnicas e estilos, os cineastas documentam a realidade sob múltiplos prismas, inclusive com ficção. Exploram diferentes perspectivas incitando o público a reflexões acerca do mundo que o cerca.
Estilos de Documentário
A variedade de temas e abordagens presentes nos documentários resulta em uma rica diversidade de estilos. Entre os mais comuns, podemos destacar:
1. Expositivo:
- Prioriza a apresentação de informações e fatos através de narração, entrevistas e imagens de arquivo.
- Frequentemente utilizado em documentários históricos, biográficos e educativos.
- Exemplos: O Equilibrista (Man on Wire – 2008 – EUA), Democracia em Vertigem (2019 – Brasil) e Ícaro (Icarus – 2017 – EUA).
2. Observativo:
- Documenta a realidade sem interferência direta do cineasta, capturando o comportamento natural de pessoas e situações.
- Valoriza a imersão do espectador no ambiente retratado, proporcionando uma experiência autêntica.
- Exemplos: Primárias (Primary – EUA – 1960), High School (EUA – 1968) e Bullying (Bully – EUA – 2011)
3. Participativo:
- O cineasta se insere na narrativa, interagindo com os personagens e influenciando o desenrolar dos eventos.
- Explora diferentes perspectivas e subjetividades, criando um diálogo entre o cineasta e a realidade.
- Exemplos: Super Size Me – A Dieta do Palhaço (Super Size Me – EUA – 2004), Blackfish: Fúria Animal (Blackfish – EUA – 2013) e Edifício Master (Brasil – 2002).
4. Poético:
- Utiliza elementos estéticos e simbólicos para criar uma experiência sensorial e emocional.
- Busca despertar reflexões e interpretações subjetivas do espectador, indo além da mera apresentação de fatos.
- Exemplos: Koyaanisqatsi: Uma Vida Fora de Equilíbrio (Koyaanisqatsi – EUA – 1982), Um Cão Andaluz (Un chien andalou – 1929 – França) e Nostalgia for the Future (Índia – 2019).
5. Reflexivo:
- Explora questões filosóficas e existenciais através da análise de eventos e situações da realidade.
- Convida o público a questionar suas próprias crenças e valores, promovendo a reflexão crítica.
- Exemplos: Jogo de Cena (Brasil – 2007), O Sanduíche (Brasil – 2000) e Eram os Deuses Astronautas? (Erinnerungen an die Zukunft – Alemanha – 1970)
6. Performativo:
- Utiliza elementos da ficção e da performance para apresentar a realidade de forma não convencional.
- Questiona os limites entre realidade e representação, criando uma experiência imersiva e engajadora.
- Exemplos: Valsa com Bashir (Vals Im Bashir – Israel – 2008), Verdades e Mentiras (F for Fake – 1973 – EUA) e Tiros em Columbine (Bowling for Columbine – 2002 – EUA)
Vale ressaltar que essa categorização não é rígida, e muitos documentários podem apresentar características de diversos estilos. A riqueza do gênero documental reside justamente na sua diversidade e capacidade de abordar a realidade sob múltiplas perspectivas.
Dica de livro: O documentário: Um outro cinema, por Guy Gauthier.
Dica de vídeo: A forma do cinema documentário